Vendo a foto eu mudei bastante fisicamente, né? A Naiara de 10 anos atrás tinha 16 anos e estava indo acampar pela primeira vez. Se eu não me engano, levei uma chapinha para o camping. A minha vida mudou muito e não foram só as mudanças que vemos na foto, eu sou uma nova versão da Naiara.
Era verão, carnaval e eu me preocupava muito com a minha imagem e com o que os outros pensavam sobre mim. Apesar de usar regata e shorts, eu odiava o meu corpo, principalmente as minhas coxas. Nessa época eu também não gostava e nem conhecia o meu cabelo natural, alisava para me sentir mais aceita pela sociedade. Foi uma fase bastante conturbada, eu não me sentia bem e me cobrava muito. Relembrar tudo que estava acontecendo em 2009 ainda me deixa desconfortável. Foi um ano de perdas na família, de traumas e de descobertas. Eu me sentia muito deslocada e queria encontrar o meu lugar no mundo. Eu achava que tinha um lugar onde eu ia me sentir confortável e aceita. Eu ainda não sabia que eu mesma era esse lugar.
Olho para o passado e gostaria que a Naiara de dez anos atrás tivesse sofrido menos por tudo. Queria que ela soubesse que não precisava caber em padrão nenhum e que não precisava priorizar as necessidades dos outros. Queria que ela entendesse que não precisava ser aceita por ninguém e que ser gorda não era uma ofensa, por isso ela não precisava agradar todo mundo. Infelizmente, eu não posso mudar o que passou e nem deletar todas as vezes que sofri pelo meu corpo, mas é reconfortante saber que hoje eu olho no espelho e me reconheço.
Os últimos 10 anos não foram brincadeira. Olhando a foto não dá para saber que eu senti dores que achei que nunca passariam e passaram. Nem que eu fui morar em São Paulo, estudei jornalismo, fiz amigos, trabalhei em redações grandes, fiz freelas, fiz um TCC foda sobre a América Latina, conheci a Colômbia, a Bolívia e o Peru, me hospedei na casa de uma mulher boliviana que fazia casa de garrafas pet para gente pobre, entrevistei o general que matou o Che Guevara, me frustrei com a faculdade onde estudei, fiquei sem grana, vendi a minha câmera que era o meu xodózinho, trabalhei em caixa de balada e em loja de roupa. Também viajei muito trabalhando como repórter, ganhei três prêmios como jornalista cobrindo agronegócio, fiz uma publicidade para a Dove, fiz ensaio sensual de calcinha e sutiã, inspirei outras mulheres, paguei uma viagem para a Europa 100% com o meu dinheiro, morei em sete apartamentos diferentes, passei um carnaval no Rio de Janeiro, me apaixonei, sofri demais, me apaixonei outra vez e comecei a ser honesta comigo e a me respeitar. Fiquei muito mais próxima do meu irmão, entendi cada vez mais os meus pais e fiz questão de reunir a família sempre que possível.
Nos últimos anos, teve dia que eu não queria levantar da cama e que não tinha vontade de viver. Uma vez organizaram uma comemoração de aniversário para mim e a minha melhor amiga teve que me buscar na cama (obrigada por ter ido, te amo), porque eu não conseguia levantar, eu só sabia chorar e achava que não tinha motivo para comemorar. Também tiveram dias de muita alegria, novas amizades, entregas, momentos simples e necessários. Que loucura foram os últimos 10 anos!
Só com as fotos também não dá para saber que eu tive crises de ansiedade, nem que comecei a fazer terapia e que em alguns momentos a vida virou de cabeça para baixo. Nos últimos anos também conheci o meu futuro marido, a revista que eu trabalhava fechou e disso surgiu uma ótima oportunidade de recomeçar mais uma vez, agora com mais pé no chão e menos cobranças.
Eu estou contando tudo isso porque simplesmente não dá para resumir 10 anos em uma foto e na transformação visual. Cada pessoa viveu uma batalha diferente na última década. Gosto de lembrar que a vida não é perfeita todos os dias, fica mais fácil encarar os dias ruins quando a gente sabe que eles existem. Com tantas experiências, aprendi que gostar de mim deixa tudo mais fácil. Eu amo a mulher que me tornei nos últimos anos e tenho muito orgulho de tudo que consegui realizar até aqui.
Eu não fazia ideia de como a vida mudaria em 10 anos e de como me amar me transformaria em uma mulher poderosa. Sou grata por ter saído da minha zona de conforto, por me desafiar sempre e por agarrar a oportunidade de me conhecer. Sou grata também pelas amizades maravilhosas e inspiradoras que fiz nos últimos anos e pelas minhas realizações pessoais e profissionais. Sou grata pelo feminismo, esse movimento incrível e necessário que me abriu os olhos. Sou grata por sempre ter sido muito amada pela minha família, sempre tive a certeza de que entre eles eu estava segura e isso faz muita diferença quando a gente não está bem. Mesmo com todas as mudanças, conflitos e dificuldades, eu gostaria de nascer na mesma família em todas as vidas.
A Naiara de 2016 não fazia ideia de que dez anos depois ela estaria morando em outro país e escrevendo tudo isso no seu próprio blog. Mas a vida é isso, é viver o imprevisível todos os dias e tentar ser a minha melhor versão a cada recomeço.
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